The Shins - Heartworms ****

Pop dos anos 80 (“Fantasy Island”), coisas meio psicadélicas (“Painting a Hole”), valsas lentas e apaixonadas (“The Fear”), memórias da new wave (“Half a Million”) e mesmo um tema acústico, algures entre a country e a folk britânica (“Mildenhall”). Sim, este é um disco que, em apenas 11 canções, percorre quase toda a história da música popular das últimas décadas. Presume-se que a pretensão não seja demonstrar qualquer ecletismo ou virtuosismo, mesmo tendo em conta que tudo isto sai praticamente da mesma cabeça, James Mercer, o inventor da banda, já lá vai década e meia. O resultado, diga-se, é muito divertido, um objeto pop para dançar, sonhar, assobiar e todos os verbos demonstrativos da alegria que só a música pode desencadear. Estranho, este Mercer. Explosão de criatividade sempre que grava, sendo que grava muito pouco (o disco anterior data de 2012). É, portanto, de aproveitar.

Spoon - Hot Thoughts ****

Quem aqui chega, ao acaso, é capaz de subentender Arcade Fire no segundo tema, de título quase impronunciável. Outros, mais ilustres mas também desprevenidos, tenderão a admirar a atmosfera tão Bowie-da-fase-Low em “Us”, que fecha o disco. As comparações são, porém, menorizadoras para a banda, que já vai no nono disco, emergindo lentamente da cena indie para um quase estrelato que alguns temas deste disco deixam antever. “Tear It Down”, uma balada aditivada, ou o funk, igualmente musculado, de “Can I Seat Next to You” estão mesmo a pedir estádios, tops e, claro, pistas de dança. Os Spoon continuam a praticar um pós-punk, aparentado do funk, em que a batida e a guitarra são rainhas, mas agora com uma muito mais proeminente electrónica, saudosa do disco, que faz tudo isto muito mais luminoso e, porque não dizê-lo, divertido. E com a liberdade criativa que lhes permite ousar dois instrumentais de cinco minutos, perfeitamente coerentes com tudo o resto.

Jason Isbell and the 400 Unit - The Nashville Sound ****

Não, Jason Isbell não é apenas mais um cantor country. Há pelo menos duas razões de peso para que o ouçamos. Antes de mais, para percebermos, de forma muito evidente, como o tal country (mais o blues, que não é para aqui chamado) esteve na origem do muito que hoje ouvimos. Jason nunca se fica pelo country, apenas parte dele para outra coisa qualquer. E depois porque Jason é aquilo a que há uns anos se chamava cantautor, alguém que, mais do que autor e cantor, é também um contador de histórias, parábolas da vida contemporânea. Do horror pela eleição de Trump (“White Man’s World”) às doçuras e agruras do amor, que dão origem a duas das mais belas canções do disco: “If We Were Vampires”, em dueto com a mulher, Amanda Shires, e “Chaos and Clothes”, com a voz duplicada do autor. A honestidade com que se expõe, a teimosia em seguir valores, tornam Jason em alguém quase antiquado, como canta em “Last of My Kind”.

Feist - Pleasures ****

Quando se chega a “I’m Not Running Away”, já quase no final do disco, apetece voltar ao início e ouvir tudo de novo, agora à sombra dos blues. Essa é a canção em que fica mais exposta a ossatura fundamental desta aventura de Feist. O recurso ao blues, a mais essencial das músicas, para cantar as mais perenes histórias da humanidade, histórias de ternura e dor, sexo e morte. O blues, insiste-se, será apenas a ossatura, num corpo musical surpreendentemente musculado – que evolução, nestes seis anos de silêncio desde Metals -, e falho de gorduras, de adornos inúteis. Os instrumentos são os estritamente necessários, numa gravação quase caseira (“Get No High, Get Not Low”), e dispostos do modo rude, sem artifício evidente (“Pleasure”, ou “Century”, esta com Jarvis Cocker a cantar “outra” canção. Já “A Man Is Not His Song”, ou “Any Way” (aquele começo à Kinks…), na sua simplicidade, atestam que estamos perante uma compositora de calibre mais que razoável.