Marissa Nadler - Strangers ****

O disco encerra com Marissa Nadler, a solo com guitarra eléctrica, cantando "you never bring me down", em "Dissolve", uma belíssima e sincera canção de amor. Uma excepção, num disco de capa a preto e branco, e em que o refrão do tema título fala de alguém muito só que canta no escuro. As canções de Marissa Nadler são de um cinzento denso. Cinza dos amores falhados, cujo expoente talvez seja o disco anterior (July, 2014), mas cinza também pelo cepticismo em que tudo se desenvolve, e cinza, ainda, porque, apesar de toda essa negritude, há frestas de luz que insistem em aparecer. "Dissolve" é também uma excepção, porque, nesta sétima gravação, a cantora e o produtor Randall Dunn voltam a vestir as canções outrora quase folk de densidade barroca, feita especialmente de teclas e cordas. "Janie in Love" é o tema que melhor casa a velha guitarra com essa parede sonora e, por isso, o mais recompensador do disco.

Tindersticks - The Wainting Room ****

As canções dos Tindersticks dividem-se em duas categorias: as que são bandas sonoras, especialmente dos filmes de Claire Denis, e as que são filmes elas próprias, que contam histórias de forma cinematográfica. Neste disco, as canções ocupam as duas categorias. Ouvimo-las enquanto curtas metragens, mas podemos vê-las nos pequenos filmes, de vários realizadores, inspirados nas canções e publicados numa edição especial do disco. Mas fiquemo-nos pela música. Há uma canção ("We Are Dreamers!"), que sobe directamente ao top das melhores da banda - um dueto, de enorme tensão, com Jehnny Beth (The Savages); outro dueto, este diferido no tempo e em registo contemplativo, com Lhasa de Sela ("Hey Lucinda"); e ainda uma estreia, um tema de grande influência afro ("Help Yourself"). O resto é, ainda e sempre, Stuart Staples em grande forma. Uma bela celebração do 25.º aniversário dos Tindersticks.

Red Hot Chili Peppers - The Getaway ****

A evolução das espécies aplicada à música. Ir mudando algo para que se perceba que algo muda, mas nunca mudar mais que o suficiente para que tudo fique mais ou menos na mesma. Os RHCP não são muito diferentes dos outros, mas são um dos expoentes desse darwinismo musical. Há uma fórmula - que, a brincar a brincar, já tem três décadas -, a qual assenta num punk evoluído, ensopado em soul e funk. Uma linha de baixo muito marcada, com duas ou três matrizes alternantes, curtos solos de guitarras, fugazes apontamentos de cordas, aquela voz que avia sílabas a velocidade estonteante. Neste disco, que quebra um silêncio de cinco anos, Danger Mouse substitui Rick Rubin na produção e isso nota-se na toada mais planante ("Feasting on the Flowers" e "Dreams of a Samurai". Mas, no geral está tudo na mesma ("We Turn Red"). O que é bom, a evolução das espécies é um processo lento e não se coaduna com revoluções.

The Monkees - The Good Times! ****

Os Monkees nasceram há 50 anos, numa série de TV, para macaquearem literalmente os Beatles. Tiveram tanto sucesso que os levaram a sério e eles próprios se levaram a sério. No final da década, já cantavam Carole King, Gerry Goffin, Neil Diamond e, espanto!, canções escritas pelos próprios. A partir daí, a história conta-se num instante, ao ritmo inacreditável de um disco por década. Em 1996, saiu "Justus" aquele que foi encarado com o seu último disco, até porque, ainda muito antes do desaparecimento de Davy Jones, um dos quatro fundadores, em 2012, já a banda andava aos tropeções de palco em palco. Mas em 2016, os três septuagenários restantes surpreendem com um novo e, bem bom, disco. E até Jones apareceu para dar voz a uma das canções. Uma das belezas deste disco é o modo como viaja entre décadas. Entre a recuperação de canções dos anos 60, a voz de Jones perdida numa gravação, e temas, por exemplo, de Noel Gallagher ou Andy Partridge. Tudo muito divertido.


Bob Dylan - Fallen Angels ****

Há o carteiro que toca sempre duas vezes. E há Dylan, que toca sempre duas ou três vezes. Ao longo de cinco décadas de carreira, não há disco de Dylan que sofra de solidão. No início, no auge da década de 60, na fase católica, no renascimento dos anos 2000, o que Dylan queria dizer ou demonstrar prolongou-se sempre por dois ou três discos. Volta a ser assim, com esta fase dos grandes standards da música americana centrados em Sinatra. Por isso, em 2016, temos o segundo capítulo da saga iniciada com "Shadows in the Night" (2015). A grande diferença está no tom: à melancolia e ao coração partido de "Shadows", sucede a exuberância dos amores e paixões. A voz de Dylan adapta-se quanto baste, embora a  sua debilidade característica funcione melhor no tom menor do primeiro disco. A grande melhoria está nas orquestrações, brilhantes em alguns casos ("Maybe You'll Be There", ou "Melancholy Mood"), mas sempre muito interessantes. A dúvida: haverá terceiro disco, ou irá Dylan reinventar-se novamente?