Lykke Li - I Never Learn ****

Claro que nunca deveríamos confiar numa miúda que escreve uma canção intitulada "A Tristeza É Uma Benção" (Wounded Rhymes - 2011). Muito provavelmente inspirada em factos reais, ela leva agora a coisa às últimas consequências. São nove (nove!) canções encharcadas em lágrimas, voz dorida (e como se nota e ouve!), corações partidos, o amor que acabou e que nunca, mas nunca, mais voltará. Sem réstea de luz ou esperança. Mas, como em todos os exorcismos, há prazer nesta dor. Por exemplo, o prazer de recriar a "wall of sound", de Phil Spector: a maioria dos temas começa de mansinho, evocando os ambientes planantes do primeiro disco, evoluindo depois para massas sonoras muito consistentes, a que não faltam camadas de coros, cordas e castanholas (sim, castanholas, em "Heart of Steel"). Destas vagas sonoras escapa aquela que talvez seja a melhor canção do disco, "Love Me Like I'm Not Made of Stone", uma balada com guitarra acústica. E um nó na garganta, claro.

Lily Allen - Sheezus ***

Qual é melhor? Beyoncé ou Lorde? Pois... a resposta não é fácil, simplesmente porque a pergunta está mal feita, ou mais propriamente não faz sentido. Mas é a essa pergunta, e a outras similares, que Lily Allen tenta responder neste disco. Afinal, a indústria musical é a boa ou a má da fita ("Hard Out There")? E o jet set das revistas, boa ou má gente ("Insecerely Yours")? E aquela malta das redes sociais, é mesmo para levar a sério ("URL Badman")? Não é preciso ser politicamente correcto para se perceber que, nos tempos que correm, não há certo nem errado. E que errado acaba por estar quem, como Lily, usa (e talvez abuse) do sarcasmo para criticar o meio no qual, bem vistas as coisas, vive. E no qual tem sucesso. Verdade, verdade é que não vale a pena levar as coisas muito a sério. Este é um disco pop e ninguém pode pedir à pop que salve o mundo. Apenas que nos divirta e nos faça rir de nós próprios, repetindo, de forma razoavelmente agradável, velhas e conhecidas fórmulas.

Damon Albarn - Everyday Robots ****

Arrancar toda a beleza que pode haver na melancolia. E fazer dela música. Esse parece ser o projecto de Damon Albarn, especialmente desde que, há década e meia, ainda na vigência dos Blur, inventou os Gorillaz. Mas nunca como neste disco, o primeiro verdadeiramente em nome próprio, esse desígnio foi concretizado de forma tão radical (embora as sementes já fossem bem audíveis em Plastic Beach, dos Gorillaz em 2010). Damon é um excelente autor, um intérprete mais maduro (notável a densificação da voz neste disco...) e um encenador de canções extraordiariamente inventivo (ruídos, vozes de rua, ensembles de cordas, pianos, guitarras acústicas - tudo vale para criar uma sonoridade quase cinematográfica). "Mr Tembo", reggae e gospel numa cantilena quase infantil, e "Heavy Seas of Love", a que Brian Eno confere a impressão digital, são as excepções à melancólica introspecção geral (belíssima "The Selfish Giant").

Frankie Chavez - Heart & Spine ****

"Pine Trees" não é apenas um dos temas mais belos deste disco (a chuva em fundo e tal...), é também aquele em que, através da omnipresença da guitarra portuguesa, há uma real tentativa de romper com a ortodoxia do blues e do rock'n'roll dominantes. Não se pode pedir aquilo que as pessoas não querem dar e Frankie Chavez assume em disco a preferência pela apropriação sem filtros da música de raiz americana. Nem que seja na vertente "feel good" havaiana estilo Jack Johnson de "Don't Leave Tonight", um tema que até pode alegrar o verão das rádios, se alguém fizer por isso. É, na verdade, nos momentos mais calmos do disco que se verifica um maior investimento criativo, com a introdução de vários apontamentos de composição e instrumentação dissonantes ("Sail Upon Your Shore"). Os temas mais pesados ("Fight", "Heart & Spine") são bem esgalhados - importante, para a circunstância - mas menos surpreendentes.

Aloe Blacc - Lift Your Spirit ***

Replicar o êxito de "I Need a Dollar" (2010) era apenas um dos desafios de Aloe Blacc para este disco, o primeiro lançado por uma grande editora. Êxitos para a rádio não faltam por aqui, embora talvez nenhum multiplique tanto os dólares, até porque o mais robusto ("Wake Me Up", numa versão acústica), já rendeu bastante, em 2013, numa versão com o produtor sueco Avicii. Eventualmente "The Man", que cita explicitamente "Your Song", de Elton John, possa fazer esse papel. Mas Aloe tinha outro desafio - demonstrar que é um herdeiro fiável da melhor soul do século passado. A resposta acaba por ser uma fuga em frente, ou seja, a aposta no puro sucesso comercial, em detrimento do apuro estilístico. Coisas para a pista de dança ("Love Is The Answer", com Pharrell Williams), para o estádio ("Here Today"), ou para o sofá ("Red Velvet Seat"), com soul, é certo, mas num registo apressado e pouco sentido.

Ray LaMontagne - Supernova ****


Nunca Ray LaMontagne tinha ido tão longe em ir tão atrás. As influências psicadélicas eram já percepíveis nos quatro discos anteriores, mas a melancolia e algum intimismo eram ainda as notas dominantes. Este Supernova é, pelo contrário, uma explosão de cores, que se desenvolve em paletas sonoras estritamente confinadas ao final dos anos sessenta. Às tantas, convencemo-nos de que estamos a ouvir os Pink Floyd de Syd Barrett, em "Smashing", os Jefferson Airplane, em "Lavender", Neil Young, em "Ojai", os Byrds, em "Drive-in Movies", e por aí fora. E depois há canções, como "Pick Up a Gun", quase perfeitas, na sensação de terem absorvido toda uma época revista pelos anos que lhe sucederam. É certo que parte da magia vem da produção de Dan Bauerbach (Black Keys), mas - justiça seja feita - o material de base, as canções, está bem à altura da ambição. Os fãs, claro, vão ter saudades daquela voz funda e sofrida de outras eras. Mas este é um disco de Verão!