Billie Joe + Norah Jones - Foreverly ***


A música em forma de estafeta, com efeitos de loop. É assim: em 1958, os Everly Brothers gravaram um disco intitulado Songs Our Daddy Taught Us, constituído por 12 velhas canções country convertidas em harmoniosas melodias com acompanhamento de guitarra. Mais de meio século depois, uma cantora de jazz ligeiro e um vocalista de uma banda punk pegam nas mesmas 12 canções e devolvem-nas ao universo country. Nada se perde, tudo se transforma. Pouco se ganha. As interpretações, embora agradáveis, são relativamente banais, com Billie Joe Armstrong (voz dos Green Day) sempre mais ou menos na condução e a doce Norah Jones em segundo plano, nas harmonias. Os arranjos espraiam-se por várias sonoridades country, sem nada de especialmente memorável. "Down in The Willow Garden", talvez pelo dedilhar da guitarra, ganha uma certa intensidade indie, mas o resto é de um classicismo irrepreensível. Apenas.

The Beatles - On Air, Live at The BBC Vol. 2 ****


Estamos no domínio da arqueologia virtuosa. Não se escava para descobrir, escava-se pelo simples gosto de escavar e por saber que, lá no fundo, está tudo aquilo que esperamos... e de que gostamos. Muito. Este disco (o primeiro da série saiu há 20 anos!) consiste na reprodução de umas dezenas de actuações na BBC, maioritariamente em 1963. A diferença, e graça, face ao anterior é que, desta vez, as canções são ligadas por diálogos entre o locutor e os quatro fabulosos. Na prática, tratava-se de um programa de discos pedidos, com os quatro a responderem com humor aos pedidos e a lidarem com os primeiros alvores do estrelato. As versões são obviamente boas (os Beatles sabiam mesmo tocar e cantar...), mas muito pouco diferentes das que já conhecemos. O grande valor documental deste duplo CD são as quatro entrevistas individuais (5 minutos cada), nas vésperas do Rubber Soul e do Revolver e, aí sim, estamos já perante a genialidade.

Robbie Williams - Swings Both Ways ***

Robbie Williams é um artista e ponham polissemia nisso. Um extraordinário sentido do espectáculo, um jeito muito especial para se reinventar, uma auto-ironia desarmante. Este disco é isso, um divertimento pegado, Broadway revisitada, através de standards, de versões de canções próprias e até de alguns originais, por sinal as peças mais interessantes desta aventura. Por exemplo, o dueto com Rufus Wainwright em "Swings Both Ways", de longe o segmento que mais brilha, num divertido jogo de troca de identidades sexuais. Ou a sentimental e inspiracional balada "Go Gentle", um rosário de (bons) conselhos para a filha. No campo das desilusões, talvez o dueto com Lilly Allen em "Dream a Little Dream", com muito menos charme que o "Something Stupid, com Nicole Kidman, da anterior aventura swing, de 2001. E talvez esse seja o ligeiro problema deste disco: a falta de surpresa. Não basta que o swing seja perfeito.

You Can't Win, Charlie Brown - Diffraction/Refraction *****

Imaginem que os Grizzly Bear se cruzam em Lisboa com Nick Drake ou Tim Buckley... Ups, desculpem, este é o início de um press release sobre a banda e a Time Out não copia press releases. E noutro press release fala-se também de Bon Iver e Sufjan Stevens... Talvez ainda lhe juntasse Arcade Fire ("Shout", por exemplo). Um hábito, não apenas doméstico, este de descrever a música mais pelas influências que pelo resultado final. É, convenhamos, de uma enorme comodidade. Ficamos logo a saber que estamos em território folk, ora melancólica, ora bem humorada, sempre intimista, mas também de uma enorme imaginação sónica. Há instrumentos inesperados (garrafa de cerveja, em "I Wanna Be Your Fog", uma das mais belas canções), arranjos clássicos de cordas ("Fall For You"), muitas e belas guitarras (belíssima, a sua entrada em "Be My World"), vozes maduras e coros afinados. Mas há, principalmente, um ambiente geral, muito suportado nas percussões, canónicas ou nem tanto, em teclas e outras electrónicas, que confere um cunho marcadamente onírico, talvez excessivo para certas almas mais sensíveis a sonoridades despidas (exemplo: "Under", quase a remeter para algum rock sinfónico de má memória), embora também por aqui as haja ("Heart"). Digna de nota é a homogeneidade de produção do disco. A aventura criativa e sónica não desagua numa amálgama de sons inarticulados, pelo contrário, nesta segunda gravação de maior fôlego (Chromatic, de 2011, sucedeu um a EP, de 2010), a banda surge extremamente segura em todas as frentes, fruto evidente de muita estrada, que inclui, por exemplo, a recente reinterpretação ao vivo do primeiro disco dos Velvet Underground (aventura, sublinhe-se, da qual não cai qualquer sombra para esta gravação). Janeiro começa, assim, com um dos discos do ano.

Vanessa da Mata - Canta Tom Jobim **


As canções de Tom Jobim são tão boas que servem para tudo. Para tocar e sussurrar no piano do hotel, ou para gravar obras de enorme sensibilidade e virtuosismo, como fatalmente fazem todos os grandes nomes da música brasileira. Vanessa da Mata não faz uma coisa nem outra e, tendo em conta os meios envolvidos, o balanço é bem frustrante. Por “meios” entenda-se, por exemplo, ter à disposição Eumir Deodato, um dos orquestradores de Tom, e Kassin, um dos produtores coqueluche do Brasil. O disco oscila, porém, entre alguns arranjos clássicos banais (“Desafinado”) e outros mais pop, mas igualmente banais (“Este seu olhar”), a piscar o olho às novas gerações. Mas se os arranjos e a produção não saem da mediania, o que dizer da interpretação? Nada como a interpretação de um clássico para expor a falta de ambição ou mesmo as limitações de uma voz. Este acaba por ser um bom disco para ouvir… no bar do hotel.