John Grant - Pale Green Ghosts ****

"Queen of Denmark", do disco homónimo de estreia (2010), estabeleceu um paradigma de cinismo na forma de canção dificilmente igualável. E, no entanto... No entanto, neste segundo registo, John Grant esforça-se por bater esse recorde pessoal. Não é comum encontrarmos - num disco, quanto mais numa mesma canção - tais doses de ironia, auto-ironia, crítica, sofrimento e redenção, como acontece em mais que um dos temas deste CD. As canções de Grant giram invariavelmente em torno da dor, seja a repressão da homossexualidade, o consumo descontrolado de álcool e droga, o diagnóstico de HIV, ou simplesmente os banais desencontros da vida. Banal seria, porém, reduzir esta poesia aos seus motivos próximos. É verdade que o "agente laranja" do tema "Vietnam" é assumidamente um ex-namorado, que de resto povoa todo o disco, mas será redutor ouvir "This pain / It is a glacier moving through you / And carving out deep valleys / And creating spectacular landscapes" colado a uma qualquer situação concreta. Este segundo disco confirma Grant como um extraordinário escritor de canções, com um apurado sentido lírico e dramático, que a voz encorpada serve na perfeição. "I Hate This Town", por exemplo, lembra "Going to a Town" (Rufus Wainwright), até pelas similitudes da construção sinfónica. Esse classicismo tem, neste disco, um tratamento inesperado, mercê da colaboração com Biggi Veira, dos electrónicos islandeses GusGus. O som pastoral dos Midlake do primeiro disco cede lugar à electrónica versátil, numa sonoridade a remeter amiúde para os anos 80. A frieza dos sintetizadores é, porém, temperada pela calidez das harmonias, marca de água de Grant. A par do cinismo, por questões de sobrevivência.

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