Ry Cooder - The UFO Has Landed *****

Ry Cooder é um daqueles artistas que nunca atingirá o estrelato, mas que terá obrigatoriamente um espaço generoso em qualquer enciclopédia ou história da música pop-rock. Agora sexagenário, este californiano começou a carreira no início da década de sessenta, em grupos destinados ao falhanço, transformando-se depois em músico de estúdio, cunhando uma sonoridade especial na slide-guitar que podemos ouvir, por exemplo, em algumas canções dos Rolling Stones.
Na viragem para a década de 70, iniciou uma carreira a solo, mas foram outras duas actividades que o tornaram conhecido do grande público: como autor de bandas sonoras (aquele som evocando grandes espaços de Paris Texas tornar-se-ia uma marca registada); e como uma espécie de antropólogo musical, que gravou com indianos, africanos e mexicanos, mas que, acima de tudo, ao viajar para Cuba em 1997, deu a conhecer ao mundo esse fenómeno que se chamou Buena Vista Social Club.
Convenhamos que com uma biografia destas é difícil apresentar uma antologia minimamente representativa. Mesmo que, como esta, se estenda por dois CD e quase duas horas e meia de música, apenas dos discos a solo e de meia dúzia de bandas sonoras.
A escolha das canções foi feita pelo filho (o baterista Joachim Cooder), o qual optou por fugir a uma montagem cronológica, aparentemente pretendendo revelar uma inesperada intemporalidade na música do pai.
O resultado é um disco muito vivo, como a música de Cooder, uma alegre convivência das texturas mais tradicionais da América , do rock’n’roll ao gospel, do soul ao tex-mex. A acentuar essa vivacidade surgem as pequenas, mas quase sempre muito bem-humoradas, notas sobre cada canção redigidas pelo músico.

Charles Aznavour - Duos ***

Aznavour está com 84, continua a compor e a lançar discos, corre o mundo, como sempre fez, mas agora numa não totalmente assumida tournée de despedida, até porque tenciona continuar a cantar em público sempre que lhe apetecer (e, como vimos há pouco tempo em Lisboa, bem pode continuar a fazê-lo). E agora até tem, em Paris, uma comédia musical baseada em algumas das quase mil canções que compôs (Je m’Voyais Déjà). Que mais poderia ele fazer? Sim, um disco de duetos. É uma disco que fica sempre bem na discografia dos grandes mitos, dá para revisitar velhos sucessos, talvez arriscar uma ou outra aventura e, finalmente, fazer pontes entre gerações e estilos musicais.
É isso este Duos. A empreitada, diga-se desde já, destina-se quase exclusivamente a fãs, ou seja, àquela faixa de público que ainda se lembra de Aznavour. Os outros, pouco ou nada de interessante por aqui vão encontrar.
A maioria dos temas é servida por orquestrações banais, na maioria dos casos, adaptando-se desgraçadamente aos estilos dos convidados (veja-se os casos de Céline Dion ou Sting, por exemplo).
Das duas partes do projecto (na primeira, Aznavour e os convidados cantam em francês – e nunca imaginei que Elton John tivesse um francês impecável…), a segunda é bem mais interessante. O anfitrião adapta-se que nem uma luva às línguas dos parceiros (maioritariamente inglês, mas também espanhol, italiano e alemão!) , e os temas fluem de modo bem mais interessante. Exemplo disso é a mais que famosa “She”, em dueto com Brian Ferry, muito distante das versões que já conhecemos e mesmo da exuberância que esperaríamos do charmoso ex-Roxy Music.
Curiosamente, ou talvez não, os pontos altos do disco talvez sejam os duetos com mortos (Sinatra e Piaf). É que, se calhar, já não se fazem intérpretes à altura de Charles.

Verve Remixed Christmas ****

O Natal já não é apenas quando um homem (ou mulher…) quiser. Também pode ser como cada um quiser. Este disco pode ser um dos ingredientes para um Natal diferente. A receita é conhecida: grandes produtores e DJ’s de todo o mundo são chamados a revestir o velho catálogo da Verve, a pensar nas pistas de dança, nos locais de lazer mais sofisticados, ou simplesmente no leitor de CD do carro.
Os resultados são quase sempre interessantes, raramente se ficando por meras cosméticas electrónicas. Algumas das canções ganham nova vida e outras transformam-se, verdadeiramente, em novas canções. Por exemplo, neste caso, “I Am Blessed”, de Nina Simone, apenas leva uma batida mais forte, que transforma uma canção tipo Broadway em algo entre o soul e o hip-hop. Pelo contrário, a famosa “Silent Night” é completamente transformada pelos Brazilian Girls num sexy-samba, pouco mais se aproveitando do original que o refrão de Dinah Washington.

Elisabeth Kontomanou - Brewin’ The Blues *****

Que em Paris se faça jazz deste, eis a ironia. Não estamos perante nenhuma menina sussurrante, experimentalista ou… loira. Não, Elisabeth Kontomanou é senhora de uma voz possante, a lembrar Nina Simone, e elástica (já a compararam a Flora Purim) e neste disco dedica-se ao jazz clássico, com a mais clássica das abordagens. Acompanhada apenas por um pianista, Laurent Courthaliac, também ele um classicista, mais interessado em reviver os tempos do be-bop do que em inovar seja o que for.
Ao quarto disco, Kontomanou poderá ter encontrado o registo certo, após incursões mais universalistas. A ver vamos.
O repertório é essencialmente composto por standards (o espírito de Billie Holiday anda por aqui), com a excepção de “Rosebud”, escrita por ambos os intérpretes, mas que em nada se distingue dos restantes temas.

Tony Bennett - A Swingin’ Christmas ****

Pior que as intermináveis compras de Natal só mesmo a música de elevador com que nos castigam em centros comerciais, lojas e mesmo algumas ruas. E então quando têm sininhos (e agora quase todas têm)… Mas pior, muito pior, é quando um desses artistas dos tops decide que chegou a sua hora de fazer um disco de Natal. Aí a coisa pode colocar meio mundo à beira de um ataque de nervos.
É claro que haverá sempre excepções para confirmar a regra. Por exemplo, quando Tony Bennett pega na Count Basie Big Band e decide passar a disco onze canções, mais ou menos conhecidas, alusivas à época. A ideia, diga-se, nada tem de original – há 40 anos, o mesmo Bennett já gravara Snowfall, que ano após ano voltava aos escaparates. Cinco das canções desse disco voltam este ano a estar disponíveis, mas com novas roupagens, neste A Swingin’ Christmas.
Não fosse a quantidade de vezes que a palavra Christmas é entoada e a orquestração claramente natalícia de algumas das canções e até poderíamos arrumar este disco na categoria das gravações mais jazzísticas e interessantes deste octogenário de voz bem conservada. “My Favorite Things”, por exemplo, nem é uma canção de Natal.
Mas não vale a pena fingir. Este é mesmo um disco de Natal e, talvez, o disco deste Natal. Pela colecção de clássicos que apresenta, pela qualidade das orquestrações, da interpretação, de tudo. O piano de Monty Alexander, que pontua com grande nível quase todos os temas. A harmónica de Toots Thielemans que envolve “All I Want For Christmas Is You”. Até Antonia, a filha mais nova de Tony, que aqui debuta sem envergonhar a família, em “I’ve Got My Love To Keep Me Warm”, mais uma canção de amor que de Natal. Em suma, um disco recomendável, especialmente às lojas que gostam de servir bem, em todos os aspectos, a sua clientela mais sofisticada.